O uso da microtomografia computadorizada (Micro-CT) na avaliação do preparo dos canais radiculares


Programa de Pós-graduação em Odontologia da PUC Minas (PPGO PUC Minas)

Rogério Vieira Silva (1,2)
Marco Antônio Hungaro Duarte (3)
Eduardo Nunes (4)
Frank Ferreira Silveira (4)

(1) Egresso do Curso de Doutorado – PPGO PUC Minas
(2) Docente do Curso de Odontologia da FAINOR
(3) Coordenador do Programa de Pós-graduação em Ciências Odontológicas Aplicadas – Faculdade de Odontologia de Bauru – Universidade de São Paulo (FOB/USP)
(4) Docente do PPGO PUC Minas


A microtomografia computadorizada (Micro-CT) é uma técnica não destrutiva que reconstrói amostras em uma escala micrométrica e real. É considerada como padrão ouro e sua indicação é vasta, permitindo a análise de diversos procedimentos endodônticos, incluindo estudos anatômicos, da qualidade de preparo, obturação e retratamento dos canais radiculares (PLOTINO et al., 2006).

A Micro-CT ainda apresenta a vantagem de reproduzir a anatomia dentária interna e externa de uma maneira não-invasiva, com grande visualização de detalhes, permitindo uma análise qualitativa e quantitativa em múltiplos planos (RHODES et al., 1999). Além disso, esta ferramenta tecnológica fornece dados fidedignos em três dimensões e permite comparações antes e após a instrumentação (RHODES et al., 2000; PETERS et al., 2001; BERGMANS et al., 2003).

Existem diversos aparelhos no mercado com especificações e softwares distintos. Um deles está ilustrado abaixo (Figura 1):

MicroCT 1

Figura 1: Microtomógrafo Skyscan 1174 (Departamento de Dentística, Endodontia e Materiais Odontológicos – FOB/USP). Fonte: Elaborado pelo autor.

 

Para uma maior efetividade nos estudos de qualidade do preparo dos canais radiculares, a Micro-CT vem sendo amplamente indicada e utilizada, por ser uma ferramenta segura e precisa, principalmente na área da Endodontia. Outros estudos também a utilizaram para mesma finalidade (RHODES et al., 1999; WU et al., 2000; BERGMANS et al., 2003; GAGLIARDI et al., 2015; DA SILVA LIMOEIRO et al., 2016).

As análises em relação aos preparos dos canais radiculares têm como objetivo:

  1. Mensurar e avaliar comparativamente a porcentagem de dentina removida na instrumentação por sistemas mecanizados de instrumentação e comparar a espessura mínima de dentina remanescente nas paredes mesial e distal dos dentes envolvidos, bem como o desgaste de dentina proporcionado, após o preparo dos canais radiculares;
  2. Mensurar e avaliar comparativamente a capacidade de centralização do preparo, observando o grau de transporte do canal radicular;
  3. Mensurar e avaliar comparativamente as variações do canal radicular em relação ao volume total e apical antes e após a instrumentação.

 

Abaixo seguem imagens escaneadas, reconstruídas e comparadas através da Micro-CT:

 

MicorCT 2

Figura 2: Reconstrução pós escaneamento e ilustração bidimensional superposta pré e pós instrumentação. Fonte: Elaborado pelo autor.

 

MicroCT 3

Figura 3: Reconstrução pré e pós instrumentação em canais mesiais de molares inferiores.
Fonte: Elaborado pelo autor.

 

Além disso, pode-se analisar a complexidade anatômica por meio da microtomografia computadorizada, através dos cortes axiais percorrendo os terço cervical, médio e apical (Figura 4).

MicroCT 4

Figura 4: Cortes axiais microtomográficos. Fonte: Elaborado pelo autor.

 

Adicionalmente, pode-se detectar variações anatômicas incomuns, como o terceiro canal na raiz mesial de molar inferior (Figura 5).

MicroCT 5

Figura 5: Presença do terceiro canal na raiz mesial de molar inferior. Fonte: Elaborado pelo autor.

 

Através da Micro-CT o cirurgião-dentista está apto a testar diversos sistemas indicados no preparo do canais radiculares, proporcionando o desenvolvimento de técnicas modernas e seguras, garantindo ao paciente um atendimento de excelência, baseado em evidências científicas.

 

Referências:

BERGMANS, L. et al. Progressive versus constant tapered shaft design using NiTi rotatory instruments. International Endodontic Journal,v.36, n.4, p. 288-295, Apr. 2003.

DA SILVA LIMOEIRO, A.G. et al. Micro-computed tomographic evaluation of 2 nickel-titanium instrument systems in shaping root canals. Journal of Endodontics,v.42, n.2, p. 496-499, Mar. 2016.

GAGLIARDI, J. et al. Evaluation of the shaping characteristics of ProTaper Gold, ProTaper NEXT, and ProTaper Universal in curved canals. Journal of Endodontics, v.41, n.10, p. 1718-1724, Oct. 2015.

PLOTINO, G. et al. Three-dimensional imaging using microcomputed tomography for studying tooth macromorphology. Journal of the American Dental Association. v.137, n.11, p. 1555-1561, Nov. 2006.

PETERS, O.A. et al. Changes in root canal geometry preparation assessed by high-resolution computed tomography. Journal of Endodontics,v.27, n.1, p. 1-6, Jan. 2001.

RHODES, J.S. et al. A comparison of two nickel-titanium instrumentation techniques in teeth using microcomputed tomography. International Endodontic Journal,v.33, n.3, p. 279-285, May 2000.

RHODES, J.S. et al. Micro-computed tomography: a new tool for experimental endodontology. International Endodontic Journal, v.32, n.3, p. 165-170, May 1999.

 

Anomalias dentárias e variações anatômicas que podem influenciar o sucesso do tratamento endodôntico


Programa de pós-graduação em Odontologia da PUC Minas (PPGO PUC Minas)

Eduardo Nunes (1)
Frank Ferreira Silveira (1)
Ana Carolina Tocafundo Thompson (2)
Rogério Vieira Silva (3,4)
Kênia Maria Pereira Soares de Toubes (5,6)
Caroline Felipe Magalhães Girelli (5,7)

(1) Docente do PPGO PUC Minas
(2) Aluna do Curso de Mestrado Acadêmico – PPGO PUC Minas
(3) Egresso do Curso de Doutorado – PPGO PUC Minas
(4) Docente do Curso de Odontologia da FAINOR
(5) Aluna do Curso de Doutorado – PPGO PUC Minas
(6) Docente do Curso de Especialização em Endodontia da FOUI
(7) Docente do Curso de Especialização em Endodontia da ABO-GV


O conhecimento da anatomia do sistema de canais radiculares é muito importante para o sucesso da terapia endodôntica. A detecção de anomalias dentárias e variações anatômicas é de suma importância para o correto planejamento da conduta a ser utilizada. Nesse post algumas dessas anomalias e variações serão abordadas.

 Dens invaginatus (Dens in dente)

Anomalia de desenvolvimento dentário, que resulta da invaginação do órgão do esmalte na papila dentária durante o desenvolvimento do dente. Esse processo inicia-se pela coroa podendo estender-se por toda raiz dentária. Segundo Oehlers (1957), pode ser classificado em três categorias dependendo da profundidade da invaginação do esmalte dentro do dente:

  • Tipo I: a invaginação está limitada a porção coronária do dente;
  • Tipo II: a invaginação se estende além da junção amelocementária e é mantida dentro do canal principal;
  • Tipo III: a invaginação estende-se por todo o interior do canal radicular atingindo o ápice dentário, dando origem a dois ou mais forames.

Na dentição permanente os dentes mais comumente afetados, em ordem decrescente de frequência, são incisivos laterais, incisivos centrais, pré-molares, caninos e molares. Dentes com essa variação anatômica apresentam altorisco de cárie, uma vez que bactérias presentes na cavidade oral podem adentrar e percorrer esse sítio de deformação, se tornando um fator de risco para o acúmulo de placa bacteriana.

Endo 1

Figura 1: Dens invaginatus

Cúspide em garra (Talon cúspide / Dens evaginatus)

Cúspide em garra ou talon cúspide é uma anomalia de desenvolvimento na qual uma estrutura em forma de cúspide acessória se projeta do cíngulo ou da junção cemento-esmalte nos dentes anteriores, unida à superfície lingual no sentido longitudinal da coroa, variando em tamanho, forma, comprimento e grau de união com a superfície. É mais frequente na maxila do que na mandíbula e pode estar associada com outras anomalias. Segundo Davis & Brooks (1986),  parece ter uma etiologia multifatorial, ou seja, associação de fatores genéticos e do meio externo. Em caso de necessidade de tratamento endodôntico, pode ocorrer dificuldade para acessar a cavidade pulpar.

Endo 2 final

Figura 2: Cúspide em garra

Taurodontismo

É caracterizado pelo desenvolvimento avantajado da porção coronária da cavidade pulpar, estando o assoalho deslocado apicalmente. A terminologia vem do grego “tauro”, que significa ‘touro” e ”odontos”, que significa dente. Pode ser classificado como:

  • Hipotaurodontismo: discreto aumento da câmara pulpar no sentido apical;
  • Mesataurodontismo: aumento moderado da câmara pulpar no sentido apical;
  • Hipertaurodontismo: aumento severo da câmara pulpar no sentido apical.

Caso haja necessidade de tratamento endodôntico, existe dificuldade em localizar, instrumentar e obturar os canais.

Endo 3

Figura 3: Taurodontismo

Fusão

União parcial ou total de dois germes dentais, dando origem a um dente com dupla coroa, cavidades pulpares distintas e canais separados. Caso seja necessário o tratamento endodôntico, devem ser realizados dois acessos coronários separados.

Endo 5

Figura 4: Fusão

Canal em C (C-Shaped)

Variação anatômica presente especialmente nos segundos molares inferiores. Sua morfologia consiste na configuração de uma anatomia em forma de fenda, o que dificulta o tratamento, seja na limpeza, no preparo ou na obturação do sistema de canais radiculares. O formato de “C” é de difícil diagnóstico pelo método radiográfico, apesar de que a presença de raízes fusionadas sugere uma alta probabilidade da presença dessa variação. O exame clínico do assoalho da câmara pulpar é mandatório para a confirmação do diagnóstico.

Pode ser classificado em três categorias:

  • Presença de um canal radicular em forma de “C” contínuo, ou seja, sem nenhuma separação;
  • Canal em formato de “C” no lado vestibular ou no lingual, que é a junção do conduto distal com o mésiovestibular ou com o mésiolingual respectivamente, além de um canal distinto, separado por uma parede de dentina (sistema de canais em forma de “ponto e vírgula”);
  • Separação discreta por ilhas de dentina dos três canais, como um típico molar inferior (mas a separação não necessariamente será em todo o comprimento dos canais).

A eficácia da irrigação é muito importante, devido à dificuldade de  ter eficiente preparo mecânico.

Endo 4

Figura 5: Canal em C

Bibliografia sugerida (com relatos de casos clínicos):

CUNHA RTR, SILVEIRA FF, CÔRTES MIS, NUNES E. Hipertaurodontismo Bilateral: Relato de um Caso. Rev Odontol Bras Central (2012);21(56):436-8.

NUNES E, MORAES IG,  NOVAES PM, SOUSA SMG. Bilateral Fusion of Mandibular Second Molars with Supernumerary Teeth: Case Report. Braz Dent J (2002) 13(2):137-41.

NUNES E, SILVEIRA FF, SOARES JA. Apicificação em dens invaginatus – Relato de caso. RBO (2006) 63:93-6.

SANTOS BS, SILVA RV,  PEREIRA RP,  NUNES E. Intervenção endodôntica em dens invaginatus tipo II: relato de caso. Dental Press Endod. (2016) 6(1):43-8.

SILVA RV, PEREIRA RP, NUNES E, SANTOS BS. Endodontic retreatment of mandibular second molar with C-shaped canal: case report.  Dental Press Endod. (2015) 5(1):63-7.

SOARES JA ,  SANTOS S , SILVEIRA FF,  NUNES E. Calcium hydroxide barrier over the apical root-end of a t ype III dens invaginatus after endodontic and surgical treatment. Int Endod J (2007) 40, 146–55.

Aplicações clínicas do MTA


Programa de Pós-graduação em Odontologia da PUC Minas (PPGO PUC Minas)

Eduardo Nunes (1)
Frank Ferreira Silveira (1)
Rogério Vieira Silva (2, 3)
Camila Grasiele de Sá Azevedo (4)
Paula Guimarães Dominguete (4)

(1) Docente do PPGO PUC Minas
(2) Egresso do Curso de Doutorado – PPGO PUC Minas
(3) Docente do Curso de Odontologia da FAINOR
(4) Aluna do Curso de Mestrado Acadêmico – PPGO PUC Minas


Preconizado por Torabinejad, em 1993,  o MTA é composto por alumínio tricálcio, óxido tricálcio, óxido de silicato, óxido de bismuto e silicato Tricálcio. Apresenta propriedades físico-químicas favoráveis, excelente biocompatibilidade e capacidade de estimular o reparo. Inicialmente indicado para vedar perfurações, tem sido utilizado para tratamento de dentes com ápice incompletamente formado, reabsorções radiculares e perfurações.

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Instrumentos para inserção de MTA

Os instrumentos para inserção de MTA são facilmente encontrados no mercado e apresentam como principal característica uma ponta longa e um diâmetro estreito, para permitir sua inserção no canal radicular próximo à região apical.

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Apicificação

Apicificação é um método de indução do fechamento apical em dentes não vitais com formação incompleta da raiz. Usualmente era realizada com a utilização de pasta de hidróxido de cálcio. Esse processo demandava um tempo prolongado, com necessidade de vária trocas de curativo. Adicionalmente, o material selador poderia se soltar, com possibilidade de ocorrer infiltração e risco de fratura dentária. Atualmente, o MTA tem sido o material de eleição para realização de plug apical. Apresenta ótima biocompatibilidade, propiciando uma conclusão  mais rápida do tratamento.

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Tratamento de perfuração

O MTA apresenta como característica importante o seu bom comportamento em ambientes úmidos, como em casos de perfuração do canal radicular. Portanto, tem sido amplamente utilizado diante dessa situação clínica.

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