Anomalias dentárias e variações anatômicas que podem influenciar o sucesso do tratamento endodôntico


Programa de pós-graduação em Odontologia da PUC Minas (PPGO PUC Minas)

Eduardo Nunes (1)
Frank Ferreira Silveira (1)
Ana Carolina Tocafundo Thompson (2)
Rogério Vieira Silva (3,4)
Kênia Maria Pereira Soares de Toubes (5,6)
Caroline Felipe Magalhães Girelli (5,7)

(1) Docente do PPGO PUC Minas
(2) Aluna do Curso de Mestrado Acadêmico – PPGO PUC Minas
(3) Egresso do Curso de Doutorado – PPGO PUC Minas
(4) Docente do Curso de Odontologia da FAINOR
(5) Aluna do Curso de Doutorado – PPGO PUC Minas
(6) Docente do Curso de Especialização em Endodontia da FOUI
(7) Docente do Curso de Especialização em Endodontia da ABO-GV


O conhecimento da anatomia do sistema de canais radiculares é muito importante para o sucesso da terapia endodôntica. A detecção de anomalias dentárias e variações anatômicas é de suma importância para o correto planejamento da conduta a ser utilizada. Nesse post algumas dessas anomalias e variações serão abordadas.

 Dens invaginatus (Dens in dente)

Anomalia de desenvolvimento dentário, que resulta da invaginação do órgão do esmalte na papila dentária durante o desenvolvimento do dente. Esse processo inicia-se pela coroa podendo estender-se por toda raiz dentária. Segundo Oehlers (1957), pode ser classificado em três categorias dependendo da profundidade da invaginação do esmalte dentro do dente:

  • Tipo I: a invaginação está limitada a porção coronária do dente;
  • Tipo II: a invaginação se estende além da junção amelocementária e é mantida dentro do canal principal;
  • Tipo III: a invaginação estende-se por todo o interior do canal radicular atingindo o ápice dentário, dando origem a dois ou mais forames.

Na dentição permanente os dentes mais comumente afetados, em ordem decrescente de frequência, são incisivos laterais, incisivos centrais, pré-molares, caninos e molares. Dentes com essa variação anatômica apresentam altorisco de cárie, uma vez que bactérias presentes na cavidade oral podem adentrar e percorrer esse sítio de deformação, se tornando um fator de risco para o acúmulo de placa bacteriana.

Endo 1

Figura 1: Dens invaginatus

Cúspide em garra (Talon cúspide / Dens evaginatus)

Cúspide em garra ou talon cúspide é uma anomalia de desenvolvimento na qual uma estrutura em forma de cúspide acessória se projeta do cíngulo ou da junção cemento-esmalte nos dentes anteriores, unida à superfície lingual no sentido longitudinal da coroa, variando em tamanho, forma, comprimento e grau de união com a superfície. É mais frequente na maxila do que na mandíbula e pode estar associada com outras anomalias. Segundo Davis & Brooks (1986),  parece ter uma etiologia multifatorial, ou seja, associação de fatores genéticos e do meio externo. Em caso de necessidade de tratamento endodôntico, pode ocorrer dificuldade para acessar a cavidade pulpar.

Endo 2 final

Figura 2: Cúspide em garra

Taurodontismo

É caracterizado pelo desenvolvimento avantajado da porção coronária da cavidade pulpar, estando o assoalho deslocado apicalmente. A terminologia vem do grego “tauro”, que significa ‘touro” e ”odontos”, que significa dente. Pode ser classificado como:

  • Hipotaurodontismo: discreto aumento da câmara pulpar no sentido apical;
  • Mesataurodontismo: aumento moderado da câmara pulpar no sentido apical;
  • Hipertaurodontismo: aumento severo da câmara pulpar no sentido apical.

Caso haja necessidade de tratamento endodôntico, existe dificuldade em localizar, instrumentar e obturar os canais.

Endo 3

Figura 3: Taurodontismo

Fusão

União parcial ou total de dois germes dentais, dando origem a um dente com dupla coroa, cavidades pulpares distintas e canais separados. Caso seja necessário o tratamento endodôntico, devem ser realizados dois acessos coronários separados.

Endo 5

Figura 4: Fusão

Canal em C (C-Shaped)

Variação anatômica presente especialmente nos segundos molares inferiores. Sua morfologia consiste na configuração de uma anatomia em forma de fenda, o que dificulta o tratamento, seja na limpeza, no preparo ou na obturação do sistema de canais radiculares. O formato de “C” é de difícil diagnóstico pelo método radiográfico, apesar de que a presença de raízes fusionadas sugere uma alta probabilidade da presença dessa variação. O exame clínico do assoalho da câmara pulpar é mandatório para a confirmação do diagnóstico.

Pode ser classificado em três categorias:

  • Presença de um canal radicular em forma de “C” contínuo, ou seja, sem nenhuma separação;
  • Canal em formato de “C” no lado vestibular ou no lingual, que é a junção do conduto distal com o mésiovestibular ou com o mésiolingual respectivamente, além de um canal distinto, separado por uma parede de dentina (sistema de canais em forma de “ponto e vírgula”);
  • Separação discreta por ilhas de dentina dos três canais, como um típico molar inferior (mas a separação não necessariamente será em todo o comprimento dos canais).

A eficácia da irrigação é muito importante, devido à dificuldade de  ter eficiente preparo mecânico.

Endo 4

Figura 5: Canal em C

Bibliografia sugerida (com relatos de casos clínicos):

CUNHA RTR, SILVEIRA FF, CÔRTES MIS, NUNES E. Hipertaurodontismo Bilateral: Relato de um Caso. Rev Odontol Bras Central (2012);21(56):436-8.

NUNES E, MORAES IG,  NOVAES PM, SOUSA SMG. Bilateral Fusion of Mandibular Second Molars with Supernumerary Teeth: Case Report. Braz Dent J (2002) 13(2):137-41.

NUNES E, SILVEIRA FF, SOARES JA. Apicificação em dens invaginatus – Relato de caso. RBO (2006) 63:93-6.

SANTOS BS, SILVA RV,  PEREIRA RP,  NUNES E. Intervenção endodôntica em dens invaginatus tipo II: relato de caso. Dental Press Endod. (2016) 6(1):43-8.

SILVA RV, PEREIRA RP, NUNES E, SANTOS BS. Endodontic retreatment of mandibular second molar with C-shaped canal: case report.  Dental Press Endod. (2015) 5(1):63-7.

SOARES JA ,  SANTOS S , SILVEIRA FF,  NUNES E. Calcium hydroxide barrier over the apical root-end of a t ype III dens invaginatus after endodontic and surgical treatment. Int Endod J (2007) 40, 146–55.